J.
A. LINDGREN ALVES
O
autor do texto objeto do presente fichamento é formado em Direito pena
Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Embaixador
de carreira do Brasil.
O
artigo apresenta-se na seguinte estrutura: Pré-introdução que não chega a ser
prefácio (p. 92 e 93); Introdução real: progressos e paradoxos (p. 93-95);
Humanitarismo “para inglês ver”? (p. 95-99); Os violadores democráticos (p. 99-102);
A democracia como violadora? (p. 102 e 103); A indivisibilidade dos direitos
humanos e a parcialidade das normas aplicadas (p. 104-108); Neoliberalismo
versus direitos humanos (p. 108 e 109); Conclusão: recapitulação e saídas
(p.109-111); Pós-conclusão que não chega a ser epílogo, para completar a pré-introdução,
que não chegava a ser prefácio (p. 111-113).
O
início do artigo o autor deixa seu pensamento em relação ao Direito Humano no
mundo, ao mencionar as crescentes ratificações do Tribunal Penal Internacional:
Poderia até, com algum otimismo, acreditar que o caminho para uma verdadeira Justiça
Internacional vinha se consolidando, neste início de século, com as sementes lançadas
na última década do século passado (p. 94).
O
autor aborda que o chamado direito de ingerência foi utilizado como intervenção
de forças armadas estatais em conflitos alheios, com objetivos humanitários –
sem definir em termos genéricos, universais e regulamentadores, como é da
essência do Direito, as características desse informalmente chamado “direito de
ingerência” (p. 96).
Lindgren
ressalta que conforme estabelecia a Declaração e Programa de Ação de Viena de
1993, a democracia é elemento fundamental para se obter a observância dos
direitos humanos, inclusive os “de segunda geração”. Até porque, conforme
ensinava Marshall desde a década de 40, os direitos civis e políticos sempre
foram instrumentos importantes para a consecução dos direitos econômicos e
sociais pelo proletariado dos países que se modernizaram nos dois últimos
séculos (p. 102).
O
que, sem dúvida, não foi corretamente assimilado na prática internacional, assim
como nas normas de muitos Estados que se dispõem a aplicar na jurisdição doméstica
as disposições da Declaração Universal dos Direitos Humanos e dos Pactos e
Convenções internacionais vigentes sobre a matéria, é que todos os direitos humanos,
definidos pela ONU desde de 1948 e reafirmados em sua validade universal pela
Conferência de Viena de 1993, são “... indivisíveis, interdependentes e
interrelacionados”; artigo 5º da Declaração de Viena (p. 103).
A
primeira Conferência Internacional sobre Direitos Humanos, realizada em Teerã
(a Teerã do Xá Rheza Pahlevi), afirmava, sem ambigüidades, no artigo 13 de sua
Proclamação. De significado inquestionável para qualquer leitor
bem-intencionado, o artigo 13 da Proclamação de Teerã, mais do que uma asserção
socialista contra o liberalismo capitalista, ou a definição da
social-democracia como meta programática de todos, refletia, em especial, a
reinvidicação de uma Nova Ordem Econômica Internacional pelos países do
Terceiro Mundo, com respaldo do Segundo, então dada como válida. Além dessa
distorção de origem, o artigo 13 revelou-se, logo após sua aprovação, não
somente uma afirmação inconsistente com as políticas internas da maioria dos
países que o citavam, mas também, e sobretudo, uma escusa lamentável, utilizada
por toda e qualquer ditadura – e os regimes ditatoriais eram particularmente abundantes
no período – para a denegação dos direitos civis e políticos à respectiva
população (p. 104).
Foi
em razão desse abuso interpretativo do artigo 13 e de seu mal-uso obsessivo por
governos ditatoriais que a Proclamação de Teerã tornou-se voluntariamente
“esquecida” por todos os militantes mais sérios dos direitos e liberdades
fundamentais, governamentais e não-governamentais. Permaneceu, assim, no
ostracismo, omitida das relações de documentos internacionais considerados
importantes na matéria até a década de 90, e ainda é geralmente desconhecida.
Por essa mesma razão, a segunda Conferência Mundial sobre Direitos Humanos,
realizada em Viena, em 1993, foi muito mais sutil ao tratar do assunto. (p.
105)
A
questão da indivisibilidade e interdependência de todos os direitos humanos é
abordada em diversos dispositivos da Declaração e Programa de Ação de Viena. O
primeiro que a isso se refere ostensivamente é o artigo 5º, já mencionado acima,
que reza (p. 105).
A
questão da indivisibilidade e interdependência de todos os direitos humanos é
abordada em diversos dispositivos da Declaração e Programa de Ação de Viena. No
artigo 10 da Declaração de 1993, cuja redação tornou consensual – conquanto
efemeramente – o direito ao desenvolvimento, ela estabeleceu clara resposta
revogatória, idealmente superadora, ao artigo 13 da Proclamação de Teerã, ao
dizer (p. 106).
A
solução encontrada por Viena para as distorções propiciadas por Teerã parecia
apropriada às melhores tendências do momento. Recorria à linguagem eticamente
cogente dos direitos humanos (particularmente forte no pós-Guerra Fria até
meados dos anos 90), para afirmar, sem o chavão desgastado da Nova Ordem
Econômica Internacional, a necessidade de desenvolvimento como um direito
fundamental. Rejeitava a manipulação da indivisibilidade dos direitos feita por
governos ditatoriais, objetando a invocação da falta de desenvolvimento como
escusa para a supressão de quaisquer direitos (subentendendo-se em especial os
direitos civis e políticos, de realização supostamente mais fácil).
Utilizava-se da atmosfera ainda otimista do fim da bipolaridade estratégica
para propor a cooperação entre os Estados na superação de obstáculos ao
desenvolvimento. Aproveitava a emergência das organizações não-governamentais
como atores internacionais relevantes, assim como o clima anti-estatista
facilitado pelo fim do “socialismo real” (sem falar no impulso dado pelo
individualismo crescente e pelo neoliberalismo espraiante), para declarar, com
razão, que o desenvolvimento tem por sujeito não o Estado, mas a pessoa humana
(p. 106 e 107).
Diferentemente
do ocorrido com a Proclamação de Teerã até a década de 90, o Pacto
Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais não se encontra
exatamente esquecido, nem é regularmente omitido da relação dos instrumentos
reputados mais importantes na área dos direitos humanos. Seu órgão de
monitoramento, o Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais reúnem-se com
regularidade para examinar os relatórios que lhe são submetidos pelos Estados-partes
periodicamente. O Pacto se encontra, na verdade, mais apropriadamente
“mumificado” (p. 107).
Com
o Estado nacional inerme, inelutavelmente enfraquecido, o recurso às entidades
não-governamentais é, evidentemente, válido e necessário – para não dizer
imprescindível – até porque, em princípio, não parece haver alternativa. Mas, tendo
em conta que o Direito sempre foi um atributo do Estado territorial – que dele
se servia inclusive para criar o Direito Internacional –, cabendo a esse mesmo Estado
a responsabilidade pela definição normativa interna, a observância das normas
pertinentes e a implementação das prestações necessárias aos direitos humanos,
a realização dos direitos individuais e coletivos apenas pela ação não estatal,
ainda que bem-sucedida, abandona a esfera do jurídico para entrar no domínio da
ética e da filantropia. Os direitos deixam, pois, de ser direitos (p. 109).
Num
sistema em que as normas da economia derrubam o direito ao trabalho e o Direito
do Trabalho; em que a eficiência econômica impõe o desmanche da segurança
social; em que as leis do mercado são as únicas existentes para regular a
sociedade, cabendo aos pobres a responsabilidade pela própria pobreza, aos marginalizados
a miséria absoluta, ou o crime e a penitenciária; em que o ideal da social-democracia
dá lugar por completo à aceitação do “risco” e à competitividade, a afirmação
de Zizek na epígrafe deste ensaio tende a adquirir ampla validade. A nova
normatividade emergente, mas ainda não estabelecida, para os direitos humanos,
com ênfase numa democracia sem prestações positivas, sabidamente necessárias
para a realização dos próprios “direitos negativos”, é a forma em que se apresenta
seu contrário: a inexistência real de direitos, inclusive os civis e políticos.
Faz-se, portanto, necessário lutar para que essa normatividade emergente não se
convalide, tonando-se definitiva (p. 109).
Enquanto
Zizek, com recurso a Lacan, propugna por uma atualização do Marx libertário,
não liberticida, sem repressões de qualquer tipo, na denúncia dos malefícios
disfarçados do capitalismo contemporâneo, e Habermas, também citado acima, mais
otimisticamente espera que o mundo intercomunicativo consiga algum dia
transformar a política internacional numa política interna social-democrata de abrangência
universal, todos os analistas da atualidade, por essas ou por outras vias,
reconhecem que o Estado nacional não tem condições de voltar a ser o que era. A
solução necessária aos impasses em que nos encontramos precisa ser inventada em
formas supranacionais de convivência e solidariedade, possivelmente inspiradas
no que a Europa já fez e pode vir a fazer no caminho de uma união federalista,
desde que não abandone, no sentido habermasiano da expressão, a social-democracia,
antes inseparável do Estado nacional (p. 110).
Portanto,
Lindgren em seu artigo faz uma analise crítica dos Direitos Humanos na
atualidade, analisando os impasses que este veem enfrentando com a modernidade
da sociedade e a falta da efetivação das normas de Direitos Humanos. Esta por
causa da não “ratificação universal” pelo Estados e da não prevalências das
normas internacionais sobre as internacionais. Também, foi citado o acontecido
do 11 de setembro nos Estados Unidos exemplificando a “previsão” crítica do esloveno Slavoj Zizek quando
defende que a nova normatividade emergente para o direitos humanos acaba por
ser a forma em que aparece o seu exato oposto.
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